Exma. Senhora Doutora
Desculpe lá mas vou tratá-la por TU, ok? Afinal
conheces todas as minhas cicatrizes, buracos (salvo seja), doenças e
padecimentos, tornando-me há muito, um livro aberto, ou não tivesse eu a minha
ficha clínica em dia…
Mas hoje não vou falar de mim, nem pensar, hoje vou falar da
Sra. Dra., que, ao que sei e me foi devidamente comunicado (lá estou eu a tratá-la
por Você…), fez no passado domingo dia 6 o seu último serviço SASU (Urgência
como eu costumo dizer, ou ‘horas extras’ como gosta o seu patrão de chamar),
como funcionária pública.
Sei que no final do turno, não teve uma garrafa de Porto que
tanto aprecia, uns biscoitos e abraços dos seus colegas, o que não me admira
pois é tal e qual a sua maneira de estar… simples e sem dar nas vistas. É óbvio
que se a minha amiga fosse de políticas (encostada ou filiada) não lhe
faltariam palavras de apreço e pancadinhas nas costas, 'gestos' que sempre evitou.
Mas, eu como seu doente, quero deixar aqui o meu bem-haja
por todas as horas que dispensou durante estes anos todos, àqueles que em momentos
menos bons lhe pediram ajuda e solicitaram o melhor procedimento.
Imagem Google
Como muita coisa na vida, nem tudo é (foi) perfeito, e tenho a
certeza que soube ‘perdoar’ aos bêbados (que felicidade naquelas cabeças), aos
que apareciam a dizer que estavam muito doentes (só com o propósito de ficarem
com o papel que justificaria a falta no trabalho), aos que se sentiam muito
constipados, com dores de ouvidos e afinal com mais saúde que a minha amiga (que algumas vezes trabalhou doente), já para não falar das coisas menos light…
as tripas de fora, os dedos cortados à dentada, as ameaças de morte por não ‘dar
baixa’, os pedidos ‘não diga nada aos meus Pais que estou grávida’, as vítimas das 'curiosas’ (que fugiam com o rabo à seringa quando o serviço corria mal), e, mais recentemente devido à crise, o
aparecimento daqueles que nunca usaram o sistema de saúde (muito 'informados' e críticos... «eu desconto e pago-vos o ordenado, quero ser atendido!»), e que a partir de
certa altura, deixaram de usar as clínicas e privados onde sempre foram.
Fiquemos por aqui.
Gostaria de ter estado à saída para lhe dar um abraço
apertado, mas ainda bem que o marido da minha amiga (e disse eu que a ia tratar
por TU), estava à sua espera para ir beber um copo. Ele é um tipo com sorte (e
porreiro).
E para acabar esta carta…
Doutora:
No SASU a sua actividade e
empenhamento acabaram (por vontade própria), mas sei que a sua
carreira profissional vai continuar por mais uns tempos (anos?), na Unidade de
Saúde que coordena.
Se me permites, vê lá se te despachas com a reforma…. Eu ainda quero ver, tu a escreveres as tuas memórias e falar daquilo que, para
já, não deves falar (podes mas não deves, como se diz na tropa) e mais
importante ainda, EU não quero dar a
volta a Portugal sozinho(!), mesmo sabendo que nós os dois ao volante/viagem somos uma tragédia em questões de orientação.
Beijos… daqueles.
Bad case of loving you (Doctor Doctor)
- Robert Palmer
Doctor, doctor, give me the news
I've got a bad case of lovin' you
No pill's gonna cure my ill
I've got a bad case of lovin' you